Mais uma justa homenagem ao professor Osmar

A professora Sônia Lopes nos enviou um texto de homenagem ao Professor OSmar Domaneschi. Como o RNAm já saiu, o publicaremos aqui e também na edição de maio do nosso Jornal.
Gestão Migração

Bons exemplos que ficam

A perda de pessoas que gostamos é sempre difícil de enfrentar. Todos sabemos que há um ciclo vital, mas isso não impede que nosso coração fale mais alto que nossa razão.
O Instituto de Biociências perdeu um excelente professor e pesquisador, e eu perdi um grande amigo.
Dentre os bons exemplos que tive em minha vida, posso citar com carinho o Osmar. Fui aluna dele no curso de Invertebrados I em 1975, quando ele estava em início de carreira. Naquela época, professores recém-contratados davam somente aulas práticas, e só iam para a teórica depois de certa experiência. Nas aulas teóricas desse curso, estava outro grande mestre, cujas lousas tínhamos pena de apagar: o professor Walter Narchi. Nas aulas práticas, o Osmar sempre se mostrava interessado em fazer o melhor para que os alunos entendessem a matéria e já usava para isso seus maravilhosos desenhos. Retomei o contato profissional com essa fantástica dupla de exigentes professores e de malacólogos de renome internacional no doutorado, passando a compartilhar o mesmo laboratório com eles desde 1984. Tive a oportunidade de aprender muito e de conviver com exemplos de ética. Infelizmente perdemos o Prof. Walter em junho de 2004 e agora, em março, perdemos o Prof. Osmar. Foram duas grandes perdas em pouco tempo.
No ano passado, o Osmar já com os problemas de saúde se agravando, nunca desistiu de lutar. Trabalhou até o último instante, buscando energia na paixão que tinha pela pesquisa, pela dedicação aos alunos e por suas aulas minuciosamente planejadas mesmo depois de tanto tempo de experiência. Tinha prazer em dar aulas, preocupando-se com todos os detalhes. Além das aulas teóricas inesquecíveis, na prática ele não perdia a energia, sentando-se ao lado dos alunos, esclarecendo as dúvidas com paciência e dedicação.
As aulas do Osmar são famosas no Brasil todo. Mesmo os que não tiveram aula com ele, sabem da qualidade de seus esquemas na lousa, de suas explicações, de sua empolgação e energia. Com traços firmes, os animais eram construídos passo-a-passo no quadro e iam ganhando vida, tridimensionalidade. Cada detalhe bem explicado, bem desenhado. Tudo isso recheado de entusiasmo. Ao término da aula, admirar aquela lousa era um grande prazer. Essas aulas ficaram marcadas na mente de gerações e gerações de biólogos que tiveram a sorte de ter o Osmar como professor.
Não menos cuidadosa era sua atividade no laboratório de malacologia. Detalhista, não deixava passar nada. Sempre pronto a colaborar, largava tudo o que estava fazendo para ajudar cada um dos alunos do laboratório, fossem ou não seus orientandos diretos. Isso nunca fez diferença para ele. Criou-se assim, um clima de grande amizade entre todos. Além de pesquisador exemplar, era um amigo exemplar. Sinto saudades de nossas longas conversas sobre a vida. Ficou um vácuo, que está sendo preenchido pelas boas lembranças que tenho dele.
No ano passado, quando percebeu que poderia não conseguir dar aulas desenhando na lousa, passou todos os seus desenhos para o power-point. Apesar de já estar com problemas respiratórios, deu todas aulas e desenhou na lousa. Ele não gostava de usar power-point.
Nesse ano, a muito custo e a poucos dias das aulas começarem, aceitou a idéia de não participar da disciplina Invertebrados. Ele ficou triste, pois queria continuar seu trabalho. Disponibilizou as aulas que havia montado com seus famosos desenhos, frutos de um processo de amadurecimento construído ao longo de sua ampla experiência como professor. Estou usando esse material em homenagem a ele e para que pelo menos os alunos com quem ele gostaria de estar, pudessem conhecer seu trabalho.
Não menos dedicado à sua família, o Osmar deixou para seus três filhos os legados mais importantes que os pais podem deixar a seus filhos: educação e bons exemplos.

Sônia Lopes